Várias entidades socioambientais iniciaram a articulação de um projeto de lei para ampliar a proteção dos rios brasileiros, durante seminário da Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados nesta quinta-feira (22). O evento também contou com representantes do governo federal, do Ministério Público e dos Comitês de Bacias Hidrográficas.
A ideia é superar lacunas e conflitos em leis já existentes, como o Código Florestal, a Política Nacional de Meio Ambiente e a Lei das Águas. O diretor da ONG International Rivers Brasil, Flávio Montiel, defendeu uma nova lei para garantir a proteção integral dos rios, vistos como bens necessários para a vida em geral, e não apenas para a vida humana.
“Apesar de a legislação brasileira ser muito rica e muito vasta, nós não temos uma lei específica que possa proteger os nossos rios de forma integral. A Lei das Águas é muito voltada aos usos múltiplos e tem visão muito economicista e muito utilitarista. Precisamos de algo que possa dar um viés de mais conservação e de mais proteção de manejo para os nossos rios”, apontou.
Montiel defende lei voltada para a conservação e proteção dos rios
O esboço de projeto de lei traz princípios de conteúdo ecológico, ajustes da legislação aos acordos climáticos internacionais, conexões das políticas nacionais de meio ambiente e de recursos hídricos, além de instrumentos e mecanismos de participação popular. É prevista a criação dos rios de proteção permanente, com possibilidade de manejo para restauração, assim como já ocorre em áreas florestais.
O coordenador de gestão da política de recursos hídricos do Ministério do Meio Ambiente, Anderson de Medeiros afirmou que é bem-vinda toda iniciativa que acelere o cumprimento de metas previstas nos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável. A secretária nacional dos direitos ambientais do Ministério dos Povos Indígenas, Eunice Kerexu, defende que a legislação passe a englobar visão ecossistêmica, que vá além da mera exploração dos recursos hídricos.
“Falar um pouco dos rios voadores, que espalham todo esse equilíbrio dentro da vegetação; das águas subterrâneas, que também fazem esses encontros (ecossistêmicos). Muitos de nós não percebemos o quanto isso está desequilibrado no nosso planeta”, disse.
Dados preocupantes
Ao longo do seminário, especialistas mostraram dados preocupantes sobre os recursos hídricos do Brasil. São mais de 110 mil quilômetros de rios contaminados por esgoto, sem contar a descarga industrial e a contaminação de mercúrio do garimpo ilegal. O acúmulo de pequenas centrais hidrelétricas (PCH) em alguns rios, muitas vezes, tem impacto maior do que uma única grande barragem. Secas e enchentes extremas agravadas pelas mudanças climáticas também aumentam o assoreamento dos rios e a destruição das matas ciliares.
O hidrogeólogo Luiz Amoré citou outro problema não visível: o ressecamento dos aquíferos, já detectado em 2010, e que, ao lado do derretimento das geleiras e das calotas polares, aumenta o nível do mar.
“A velocidade (natural) das águas subterrâneas é de centímetros por dia. Mas, nós estamos extraindo muito rapidamente toda a água subterrânea, jogando-a para os rios e, assim, ela atinge o oceano muito rapidamente. Dezoito por cento da elevação do nível do mar já era referente à dessecação dos aquíferos”, alertou.
Seminário foi promovido pela Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável
A deputada Erika Kokay (PT-DF) denunciou a situação do Cerrado, considerado “berço das águas”, mas com nascentes atacadas por ações econômicas.
Ações do Congresso Defensora da futura proposta de proteção integral dos rios, a diretora de políticas públicas da SOS Mata Atlântica, Malu Ribeiro, alertou os parlamentares para ações imediatas. Uma delas é a manutenção dos vetos do presidente Lula à medida provisória (MP 1150/22) do governo Bolsonaro que flexibilizava a aplicação da Lei da Mata Atlântica.
Malu Ribeiro também pediu a imediata aprovação da proposta (PEC 6/21) que inclui o acesso à água potável na lista de direitos e garantias fundamentais da Constituição.
Para o deputado Marcelo Queiroz (PP-RJ), o tema é urgente e também deve fazer parte de outras discussões em curso, como a reforma tributária, que pode impactar nos incentivos fiscais dos municípios para o meio ambiente.
“Tem que mapear tudo que existe para ajudar os nossos rios. Trazer esse tema à discussão não é um trabalho para semana que vem. É para amanhã”.
O seminário, realizado por iniciativa dos deputados Nilto Tatto (PT-SP) e Socorro Neri (PP-AC), fez parte da Virada Parlamentar Sustentável, promovida por ONGs socioambientais na Câmara desde 5 de junho, Dia do Meio Ambiente.
Reportagem - José Carlos Oliveira Edição - Ana Chalub
Fonte: Agência Câmara de Notícias
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